Acordei na confortável cama de meus hóspedes triangulinos me sentindo capaz de atravessar o mundo. Nesse momento final parecia que meu corpo sentia a proximidade do fim e eu estava muito bem. A saída de Uberlândia foi ótima, havia nuvens no céu, mas o clima parecia bom mesmo assim, e as pistas duplas finalmente começaram.
Rodando forte, atento aos radares e aos carros que passavam voando ao meu lado, rapidamente cheguei em Uberaba/MG última cidade mineira antes de São Paulo. Não podia sair dali sem um queijo. Avistei um posto com uma enorme placa escrita 'laticínios' no sentido Uberlândia e fiz o retorno. Comprei o queijo e quando volto a rodar, olho o GPS que me diz para entrar no centro de Uberaba. Pensei 'meu Deus, essa máquina já vai me colocar perdido de novo'. No final de uma rua perguntei onde estava o retorno para a pista sentido Sampa e um mineiro tranquilo me disse 'ah, por aqui tem não, só dando a vorta [sic] lááááá...' falou ele apontando para longe. Decide seguir o GPS, que, para minha estúpida surpresa, estava certo me guiando pelo meio da cidade e me levando perfeitamente de volta no caminho certo. Voltei a acreditar nele.
Logo entrei em solo Paulista. E cada vez mais sentia o fim se aproximando. Uma parte de mim queria ficar na estrada, continuar rodando, mas outra parte, a mais sensata, não via a hora de poder tomar um banho e se esticar em algo que podemos, nós mesmos, chamar de lar. A fome apertou e eu parei em uma das milhares de churrascarias gaúchas espalhadas pelas beiras de estradas de todo o Brasil.
Depois do meu último almoço on the road, voltei a rodar nas boas rodovias 'públicas' - leia-se 'sob concessão' - paulistas e, por ser motociclista e não pagar pedágio, realmente acreditar na eficiência estatal na gestão das estradas. Enquanto tirava fotos dos canaviais o clima foi fechando.
Voltei a rodar forte, preocupado com a chuva. De vez em quando uma placa indicando aos motoristas para reduzirem de 120 para 60 km/h em caso de neblina passava ao meu lado no que eu pensava 'meu Deus, será que eu vou pegar neblina?'. Pode apostar!
Comecei a ficar preocupado em escurecer na estrada antes de chegar em São Paulo. Subi a SP-348, a Rodovia dos Bandeirantes a toda velocidade e quando o céu começava ficar escuro a placa que dizia 'Perímetro Urbano' cruzou o meu caminho. Cheguei direto na marginal tietê. Não consegui encontrar lugar para parar e trocar o chip que continha os mapas da cidade até avistar uma placa 'proibido parar e estacionar - exceto emergências'. Essa era uma. Encostei e troquei o chip meio amedrontado naquela super avenida. A brusca mudança de estrada para a cidade me assustou. Duas pessoas apontaram pra mim de um viaduto o que me deixou mais neurótico ainda - momento nelson, nem bati uma foto - mas tudo ficou melhor quando o GPS informou que eu estava apenas a 3,6 km de casa. Facilmente cheguei no destino final. Não podia acreditar. Olhei para trás e lembrei de tudo, de todos as pedreiras que eu passei. Poder sentir a emoção do dever cumprido não tem preço. Fui encontrar a pessoa que mais me deu força esse tempo todo que sempre acreditou em mim - até se eu desistisse de tudo - e pude brindar a vitória de sei-lá-o-que.